20°C 33°C
Quixadá, CE

"Vá Queixar-se com o Bispo"

Queixar-se ao bispo era lei.

22/05/2023 às 07h07 Atualizada em 24/05/2023 às 23h05
Por: Redação Fonte: @renatoabrantes.advogado
Compartilhe:

A expressão vem de longe, lá do século VII, quando saiu a primeira edição do Liber Iudicium (ou “Livro dos Juízes”), depois chamado, na Espanha, de Fuero Juzgo, uma espécie de manual de procedimentos para orientar os que julgavam o povo e que nasceu da nem sempre harmoniosa relação entre a Igreja e o Estado.

Para encurtar a história, que é longa, o Liber foi uma compilação dos direitos romano e gótico (visigótico) com o direito canônico, resultando em uma lei geral, que atribuía aos bispos católicos poder para que julgassem, como que em sede de recurso, os juízes que julgassem “torto”, ou seja, contra o direito.

O texto medieval, segundo tradução de João Marques Brandão Neto, Procurador da República em Santa Catarina e estudioso da história do direito, dizia mais ou menos, assim:

Nós admoestamos aos bispos de Deus, que devem ter guarda sobre os pobres e sobre os coitados, por mando de Deus; que eles admoestem os juízes que julgam torto contra os povos, para que melhorem e que façam boa vida e que desfaçam o que julgaram mal. O bispo em cuja terra está, deve chamar o juiz que dizem que julgou torto, e outros bispos, e outros homens bons, e emendar o pleito com o juiz, segundo o que é de direito. E se o juiz não queira emendar o julgamento com o bispo, então este pode julgar por si, e faça um escrito de como emendou o julgamento e envie este escrito ao rei, juntamente com a pessoa que estava agravada, para que o rei confirme o que lhe parecer que é direito.

Assim, quem se sentisse injustiçado, tinha todo o direito de ir “queixar-se ao bispo”. Não nos esqueçamos que a ideia de “estado”, como temos hoje, com toda a sua organização e Poderes estabelecidos, é recentíssima (Revolução Francesa) e a relação com o Estado se pautava pela cooperação. Ora, diferente não poderia ser, pois a Igreja Católica, por 1.800 anos foi a única organização global cuja atuação não se atrelava às fronteiras da nações.

Aos bispos, poderiam recorrer, “queixando-se”, os “pobres e coitados”, não somente maltratados pela vida, mas, também, pelos juízes iníquos, para que “desfaçam o que julgaram mal”. Assim era. “Queixar-se ao bispo” era uma espécie de tábua de salvação que os pobres tinham frente aos abusos do braço estatal. Ao contrário de uma afronta, era um direito. Queixar-se ao bispo era lei.

Hoje, os juízes estatais, dada a benfazeja separação entre Igreja e Estado, felizmente não estão mais submetidos à “revisão eclesiástica”. Mas, a ideia persiste, uma vez que o bispo, numa diocese, pela sua função peculiar, continua sendo referência para quem procura justiça.

 

Renato Moreira de Abrantes

Doutor em Direito Constitucional

Mestre em Educação e Ensino

Especialista em Direito Canônico

Professor universitário

Advogado do Escritório Marinho & Abrantes, em Quixadá

* O conteúdo de cada comentário é de responsabilidade de quem realizá-lo. Nos reservamos ao direito de reprovar ou eliminar comentários em desacordo com o propósito do site ou que contenham palavras ofensivas.
500 caracteres restantes.
Comentar
Mostrar mais comentários
Direito & Cotidiano
Sobre o blog/coluna
Por Renato Moreira de Abrantes
Doutor em Direito Constitucional
Mestre em Educação e Ensino
Especialista em Direito Canônico
Professor universitário
Advogado do Escritório Marinho & Abrantes, em Quixadá
Ver notícias
Quixadá, CE
31°
Tempo nublado

Mín. 20° Máx. 33°

32° Sensação
1.58km/h Vento
45% Umidade
100% (1.43mm) Chance de chuva
05h35 Nascer do sol
05h29 Pôr do sol
Qua 34° 21°
Qui 32° 21°
Sex 29° 21°
Sáb 29° 21°
Dom 31° 21°
Atualizado às 16h07
Economia
Dólar
R$ 5,61 -1,14%
Euro
R$ 6,27 -0,30%
Peso Argentino
R$ 0,00 -2,08%
Bitcoin
R$ 621,564,85 +2,12%
Ibovespa
139,007,05 pts 1.79%